sexta-feira, janeiro 05, 2007

O Natal em Terras de Santa Maria

Este artigo será diferente de todos os anteriores. Este não será um artigo historiográfico, mas sim um artigo de opinião. Apresentarei uma teoria, mas sem apresentar fontes que comprovem a minha ideia.
Chegou ao fim uma época festiva em que o Natal fez as delícias dos miúdos (pelos brinquedos), dos graúdos (pela confraternização) e dos devotos cristãos (pela comemoração do nascimento de Jesus). O Natal, em Portugal, é comemorado com o típico bacalhau, com os doces tradicionais e vinho com abundância. A qualidade é outra das características da festividade. Nesta comemoração específica (para os cristãos o nascimento de Cristo, para as crianças os brinquedos e para o comum dos portugueses a oportunidade de estar com a família), como noutras comemorações, a comida e bebida são sempre as melhores possíveis.
As Terras de Santa Maria têm uma característica muito específica na comemoração natalícia. Para muitos feirenses, como eu, a ceia de Natal foi a dobrar! Passo a explicar. Existem famílias feirenses que fizeram a ceia de Natal no dia 25, quando o resto do país festejou a véspera do nascimento de Cristo no dia 24. Eu festejei nos dois dias… Para quem festeja no dia 24 é difícil entender o porquê dos festejos em algumas casas feirenses serem só no dia seguinte. A minha teoria é simples e como já disse, não passa de uma ideia construída ao longo destes últimos anos, onde falta o mais importante. Fontes que corroborem a teoria.
As Terras da Feira, durante séculos, foram administradas por famílias nobres a partir do Castelo situado em Santa Maria da Feira. Uma família destacou-se na chefia das Terras de Santa Maria. Os Pereira. Esta família pertencia ao grupo restrito da alta nobreza e os seus rendimentos seriam imensos. Basta pensar no vasto território que estava na posse desta família. Como qualquer família da alta nobreza, as festas seriam fartas em quantidade e qualidade. Esta família, como a maioria dos portugueses desde o início da nacionalidade, tinha na religião um dos pilares dos seus valores. Por isso, a comemoração do nascimento de Cristo seria obrigatória e alvo de um festejo especial. Para além dos condes da Feira, o território feirense sempre teve várias famílias senhoriais que faziam das festas uma exibição social.
As Terras de Santa Maria, como apresentei num dos artigos, tinha uma sociedade tipicamente rural, em que a maioria das pessoas laborava no campo. Por este motivo, seria normal estas famílias não conseguirem comemorar o nascimento de Cristo com a grandeza pretendida. É a partir destas características e do cruzamento das informações anteriores que estabeleci a minha teoria sobre a comemoração do nascimento de Cristo apenas no dia 25 de Dezembro. As festas destas famílias nobres precisavam de criados e é provável que tenha existido um acordo entre nobres e camponeses. Os camponeses serviam nas casas senhoriais e em troca recebiam as sobras das festas. Por isso, trabalhavam na noite de 24 nas casas senhoriais e no dia 25 faziam o jantar de Natal. Para além disto, os condes da Feira sempre foram conhecidos pela sua bondade e a população respeitava o seu poder. Por exemplo, quando a Casa da Feira passa para o poder régio, após a morte de D. Fernando Forjaz em 1700, o povo descontente, manifesta-se contra a decisão. O povo queria continuar sob o domínio senhorial. Assim, seria normal a família Pereira oferecer as sobras da ceia de Natal. No passado dia 24 de Dezembro, o Jornal de Notícias faz desta especificidade notícia. Apresenta outra explicação para o jantar de Natal no dia 25. Escreve que a Feira é uma zona de tanoeiros e que no dia 24 estariam a trabalhar no Porto e apenas regressavam a casa no dia seguinte. Esta teoria tem legitimidade como qualquer outra, mas julgo que a tradição será muito anterior. São demasiadas pessoas a comemorar no dia 25 para ser uma especificidade das famílias dos tanoeiros.
A tradição está a acabar. Ano após ano as famílias que comemoram no dia 25 diminuem. É preciso descobrir as origens desta prática e sentir orgulho em ser diferentes. Fazemos parte de uma micro-História e como já escrevi num dos artigos, o futuro da História passa pela História Local. Feliz 2007.

1 Comments:

Blogger fff said...

Muito interessante!Na casa da minha avó, (já falecida e que era natural do concelho de Arouca, numa freguesia pertinho da Feira), também era na noite do dia 25.

7/6/07 03:24  

Enviar um comentário

<< Home